Brasil: pleno emprego ou pleno subemprego?
Segundo o IBGE, a taxa de desemprego em dezembro de 2012 foi de 4,6%, uma das mais baixas de nossa história. Por causa disso, o governo tem avaliado que estamos vivendo uma situação de quase pleno emprego.
por Daniel Romero
Comparado com a década de 90, quando o desemprego atingiu níveis recordes e um caráter epidêmico, os níveis atuais de desemprego são muito positivos.
No entanto, é possível afirmar que o Brasil está vivendo uma situação de pleno emprego?
Não existe consenso no país sobre isso. Economistas da FGV afirmam que sim, mas este passo ainda não foi dado pelo IBGE, pelo governo e muito menos pelo DIEESE.
O Boletim Contra-corrente desta semana analisa a tese do pleno emprego no Brasil.
O que seria pleno emprego e como se mede o desemprego no país?
Como a metodologia do IBGE oculta o fenômeno do desemprego.
A indústria também estaria vivendo este momento aparentemente tão favorável?
Além disso, a expansão da taxa de ocupação tem rompido com a situação crônica de precariedade que marca as relações de trabalho no Brasil?
Por fim, para os setores mais penalizados, como negros e mulheres, também se poderia falar em pleno emprego?
O pleno emprego chegou?
De acordo com o IBGE, por meio da Pesquisa Mensal de Emprego (PME), a taxa de desemprego no país em Dezembro de 2012 foi de 4,6%.
Este dado se refere à média das seis Regiões Metropolitanas pesquisadas pelo Instituto: Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre.
Para o próprio IBGE, responsável pelos dados oficiais no país, ainda não é possível falar em pleno emprego. Da parte do governo, existe uma euforia travestida de cautela, pois a situação é classificada sempre como de quase pleno emprego, sugerindo que o mesmo será alcançado em algum futuro próximo.
O que é pleno emprego
Na concepção liberal, o pleno emprego é quando há um equilíbrio entre a oferta e a procura de trabalhadores no mercado; uma taxa de desemprego em torno de 02 a 03% seria um termômetro de uma situação como essa.
Esta concepção tem vários problemas, primeiro porque parte de um pressuposto de que a economia capitalista tende ao equilíbrio.
Segundo, não faz nenhuma diferenciação das várias formas precárias de ocupação, que são expressões de um tipo particular de desemprego, principalmente nos países pobres.
Para Marx, o desemprego é um contingente da população necessário à acumulação do capital, que se mostra disponível para o mesmo, como um “exército de reserva”, assumindo formas muito variadas.
Numa interpretação mais recente, Ruy Braga denomina este exército de reserva de Precariado, que é composta pela “fração mais mal paga e explorada do proletariado urbano e rural” e, justamente por isso, essenciais à reprodução do capitalismo periférico (A Política do Precariado. Boitempo, 2012, p. 19).
Sob esta perspectiva, é mais correto falarmos que o Brasil está vivendo um pleno subemprego.
O pleno subemprego
go em um país cuja precariedade é a regra do mercado de trabalho pode ser percebida pelas diferenças nos dados entre o IBGE e o DIEESE.
Segundo o DIEESE, por meio da Pesquisa de Emprego e Desemprego, a taxa de desemprego no Brasil também em dezembro de 2012 na média das Regiões Metropolitanas e o DF foi de 9,8%, mais do que o dobro dos dados oficiais do IBGE.
As diferenças por região podem ser ainda maiores, como mostra o quadro.
Mas, o que justifica tamanha disparidade?
Como se oculta o desemprego no Brasil
Para entender como se mede o desemprego no país, podemos começar com a história do jovem que mora em São Bernardo do Campo, na Grande São Paulo, e que recém terminou o curso técnico em Mecânica.
Enquanto não consegue emprego em uma grande montadora, como planejou a vida toda, trabalha na pequena oficina mecânica do tio.
O salário nunca foi formalmente definido, mas todo mês ele recebe uma “ajuda” variável do generoso parente, mesmo que ela nunca alcance sequer meio salário mínimo.
Também podemos citar o caso das duas amigas que vivem em um bairro periférico de Porto Alegre e que foram dispensadas por uma terceirizada de uma grande indústria de confecção.
Uma delas, enquanto se aperta com a aposentadoria do marido, conseguiu um bico e uma vez por semana lava as roupas do vizinho da rua de baixo.
A outra amiga ficou com tanto ódio do ex-patrão que apostou suas poucas fichas num “negócio próprio”: fez um crédito pessoal, comprou uma máquina de costura, trabalha 12 horas por dia e vende as peças que faz em casa. Por enquanto, tem conseguido pagar em dia as prestações para o banco.
Por fim, também temos a história da família de Fortaleza em que o pai já está a tanto tempo desempregado que não vai mais toda semana procurar emprego.
Este mês, eles esperam poder pagar uma parte das dívidas, porque a filha mais velha conseguiu uma vaga como professora eventual na rede pública e, se faltar muito professor efetivo, vai sobrar algumas aulas para ela.
Para o IBGE, todas as pessoas citadas acima curiosamente não seriam consideradas na taxa oficial de desemprego.
Como ocultar o desemprego
A metodologia do IBGE oculta o desemprego no país por meio de vários elementos.
O mais absurdo é aquele que considera empregada qualquer pessoa que tenha realizado um trabalho por 60 minutos durante o mês e tenha recebido qualquer quantia, como lavar um carro e receber R$ 10 pelo serviço.
Além disso, se o desempregado não tiver buscado trabalho durante a semana em que a pesquisa é realizada, ele já é considerado como inativo (ou seja, não é um desempregado).
Por fim, se alguém se identificar como autônomo, como uma das amigas de Porto Alegre, também está fora dos dados oficiais de desemprego.
Uma mudança na metodologia do IBGE poderia resultar em dobrar os índices oficiais de desemprego, algo que nenhum governo parece disposto a fazer. É mais fácil conviver com a ficção do pleno emprego.
O rosto do desemprego
Se não é correto identificarmos uma situação de pleno emprego no país, a situação se torna ainda mais flagrante quando olhamos para os setores mais precarizados: as mulheres e a população negra.
E não adianta vir com aquela resposta pronta de que o problema se resume à falta de qualificação, pois as mulheres têm mais tempo de escolaridade do que os homens e isso não lhes garantem condições melhores de emprego e renda.
O crescimento econômico e a redução do desemprego no último decênio não eliminaram a desigualdade histórica que marca a população feminina e negra.
Em algumas cidades brasileiras, as mulheres negras têm índices de de-semprego próximos aos da Espanha, que vive uma das maiores crises da sua história.
FONTE: Instituto ILAESE
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